domingo, 16 de janeiro de 2011

Reflexão sobre o infinito e os limites


Foi na mais tenra idade que a questão dos limites começou a me parecer muito confusa.
Lembro-me perfeitamente da aula de catecismo (devia ter uns sete anos) em que ouvi pela primeira vez que os tempos nunca tiveram início e nem terão fim e que o universo era infinito.
Foi a primeira grande angústia que senti. Não compreendia e isso passou a me abismar dia após dia, ou melhor, noite após noite. De dia eu esquecia e à noite me concentrava em imaginar algo que não tivesse início ou fim, sobretudo fim.
Fantasiava de todas as maneiras para tentar entender. Pensava: saio andando pelo universo, ando, ando, ando e uma hora haverá de ter um muro que será o limite. Mas, pensava, e atrás do muro? Anda, anda, anda... e eu queria que houvesse outro muro que também não seria o fim, pois atrás dele haveria muito mais o que andar.. Diante da impossibilidade de encontrar um limite eu chorava e muito. Não sei direito quantos anos chorei por não entender – mas não foram poucos, e ninguém sabia porque era de noite, a casa dormia e eu chorava baixinho.
Ninguém sabia desse sofrimento que o infinito me causava e fui vivendo, até que outros assuntos começaram a prender mais a minha atenção e esqueci-me desse.
Mas deixou seqüelas, hoje tenho certeza.
Nunca me adaptei aos limites. Se era proibido matar aula eu pulava os muros da escola para escapar ao limite imposto (sempre os muros).  Se tinha horário, eu sempre chegava atrasada para marcar minha inadequação aos limites.
Tudo que foi proibido e tido como limitante, eu desafiei.
Se o mundo não tinha limites por que eu haveria de tê-los? Não era assim tão consciente, mas o comportamento era esse.
Hoje lamento muito que ninguém tenha me explicado de maneira convincente o infinito x o finito.
A ausência de limites x a necessidade dos limites.
Entendi muito mais tarde – talvez tarde demais, que no infinito há um limite. E que ele pode ser calculado e nunca extrapolado.
Assim também nas nossas vidas. Quem foi que me deu o direito de não fazer aquilo que a princípio não quero fazer, mas que é necessário?  De onde vem a opção de não me cuidar (como se eu fosse infinita), de não realizar o que me faz bem e de postergar toda e qualquer decisão como se não houvesse consequências? Vida tendendo a zero no limite?
Será a depressão o muro preto da minha infância atrás do qual a vida continuava mas eu não conseguia ver e chorava? Sim, porque descrevo nitidamente a depressão como um muro preto depois do qual não há futuro possível.
Será a angústia ainda a falta de entendimento sobre regras e limites que precisam existir para que a vida tenha um mínimo de previsibilidade e paz interior?
Quando fiz meu MBA na Coppead, minha avaliação veio assim: aluna brilhante, livre pensadora, engajada, interessada, liderança positiva mas...avessa a regras, não pode ter qualquer chefe porque não os respeita, não faz nada com que não concorde...
Claro que tudo isso atrapalhou muito minha vida profissional. Claro que eu deveria ter cuidado muito mais de seguir as regras e me ajustar aos limites.
Mas não o fiz como de resto não o faço até hoje,
Os limites que respeito são os que meu instinto de autopreservação estabelecem e por sorte não são poucos.
Mas não são suficientes para me proporcionar uma vida satisfatória e livre de angústias. Penso que continuo em guerra com o infinito, com os limites e com a incapacidade de compreendê-los.
O mais paradoxal, é que cresci em um ambiente familiar em que eu podia saber perfeitamente como seria o dia seguinte. Não havia sobressaltos e penso que esse foi meu maior conforto. Não sou capaz de conviver com a imprevisibilidade – pelo menos muito grande e me preocupo em passar essa confiança no dia seguinte para minha filha. "pode dormir e acordar tranquila, nada vai ser essencialmente diferente amanhã. Ninguém vai te deixar, continuaremos morando aqui, continuarei te amando...”
Mas acho que sempre desconfiei que a vida não seria assim. No final, no limite é a morte e o fim...então que limites são esses? E para que mesmo?
Penso hoje que a paz que tanto desejo está muito ligada aos limites. Que deveria aceitá-los com mais tranquilidade e sabedoria, respeitando-os em nome de uma satisfação maior.
Não se trata de conformismo mas de sabedoria.
Estabelecer limites e cumprí-los. Regras e respeitá-las. Não adotar a possibilidade de não fazer como uma opção.
Precisamos todos fazer as pazes com nossa finitude enquanto corpos-seres presentes nesse aqui e agora. Precisamos cuidar do que pretendemos ser quando t tender ao infinito.
O imediatismo não nos salva.  Muito menos a depressão, a angústia, a falta de sentir, a indiferença e o ceticismo.  Essas são muito mais aprisionantes e paralisantes que qualquer limite e qualquer  muro de qualquer idade e de qualquer universo possível ou impossível.
É agora que precisamos fazer nossas escolhas para esse momento limite que certamente virá. Quer a vida vá além do muro ou não.



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