segunda-feira, 11 de março de 2013

Descaminho entre uma boa ideia e outra


Vou ser moderna
Indefinível
Indecifrável
Juntarei palavras que terão o significado que cada um quiser
Nenhum desejo de ser eterna
Apenas um segundo imperceptível
De poesia incompreeensível.
Depois morro.
Incrédula e impassível.
Desejando apenas que essa morte dure o menos que puder
Para que eu possa ter um novo momento
De poeta imprevisível
De vida inverossímel
Ressucitada em um amor que só vive se beijada
Que me permita produzir outra trama de palavras que soe talvez mais antiquada
Mas indizivelmente apaixonada



sexta-feira, 8 de março de 2013

Mergulho sem garrafa

Acabo de fazer um curso de três aulas sobre crônicas e ensaios. Depois que me veio o gosto pela escrita, inevitavelmente vieram o desgosto, a dúvida, a certeza de que o preço que me será cobrado por essse suposto prazer será alto pelo resto da vida.
E não é um prazer opcional, ele se impõe e isso tudo me remete a Kafka: "a experiência artística em nada melhora a experiência da vida". Essa afirmativa me aborrece um pouco, mas agora é tarde. Se sempre achei a vida chata sem escrever, no máximo continuarei achando, só que escrevendo.
O que aconteceu de verdade é que assumi minha condição de aspirante a escritora e fui para um primeiro curso, começar a entrar nesse universo, tentar aprender esse idioma e, com sorte, ter algumas sugestões de direção.
Três grandes cronistas/ensaístas do Globo, ótimas aulas  para ouvir e me deleitar com tanta cultura, tanta experiência , mas....e as respostas?
Antes de tudo eu precisava saber onde estavam as perguntas.Essas, eu até podia vislumbrar. À medida que eles falavam eu sentia milhares de pontos de interrogação na minha alma, na minha cabeça, nas minhas vísceras, nos espaços vazios entre umas e outras, no meu inconsciente traiçoeiro que me abandona justo quando mais preciso dele, no meu silêncio que não compreende ou na minha falação desenfreada também desprovida de qualquer sentido.
Agora, as respostas... Essas simplesmente não existem. Todas as perguntas que temos, se recusam a ser respondidas .  A escrita é uma criança mimada que tapa os ouvidos e canta “lá lá lá lá” para não escutar. Fosse eu de outra época e a deixaria ajoelhada no milho até me dizer algo que diminuísse a dor e o sofrimento que, finalmente, descobri que tomam conta de todos aqueles que trabalham com a palavra, não importando o gênero. Quisera ter vivido em outra época, qando tudo tinha normas e sabia-se com um bom grau de precisão o que era admissível ou não, permitido ou não, arte ou não. Versos só com uma determinada forma dependendo da época. O resto, heresia ou mau poeta. Romances, novelas, contos -  para cada gênero regras precisas. Escolas com nomes precisos. Autores bons e maus, seguros do que buscavam.
Crônica, bom, essa não existia nem nunca existiu. Em nenhum lugar do mundo. Só no Brasil e só no Rio. Mesmo os cronistas não cariocas viveram bastante tempo no Rio de Janeiro. Não seria o caso de  eu ter nascido no final do século xviii  já que a crônica aparece como gênero m 1854 com José de Alencar?
Mas não. Parafraseando Caetano Veloso, “deus é um cara gozador adora brincadeiras” e me botou no mundo bem na modernidade, quando todos os conceitos mudaram, quando ninguém em sã consciência consegue definir o que é arte, quando os gêneros se embaralharam, se somaram, se confundiram; quando tudo é permitido mas a avaliação de quem interessa é extremamente rigorosa; quando não é mais a forma que está em jogo, mas a singularidade de cada autor.
Segundo um dos meus professores, produzir arte é transformar o sintoma em estilo, é a energia que vai do autor para o mundo e que, segundo Freud, está ligada ao prazer. E eu continuo: ao gozo e ao sofrimento.
Outro professor disse que a crônica só se faz se o cronista for um “errante”. Andar pelas ruas e captar um instante, um retrato singular de seu tempo e de seu lugar. E não aparecer nesse retrato. Sair do espaço da foto. Colocar-se como um espectador privilegiado da cena mundana que qualquer um pode fotografar, mas não do ângulo que o cronista escolheu.
De novo deus brincou comigo: ai de mim que ando pelas ruas e não presto atenção ao meu redor; ai de mim que saio a caminhar e meu mundo interior continua sendo a minha paisagem preferida. Com sorte, posso captar algo que, vindo do exterior, mexa com a minha cabeça ou meu coração. Aí sou capaz de notar. Fora isso, toda a cidade me escapa. Ao construírem um prédio novo, não tenho ideia do que ali havia antes.  Não reconheço nas ruas as pessoas públicas: artistas, políticos, empresários, jornalistas; não noto muito construções importantes ou escolas arquitetônicas especificas.  Porque será que não olho?
Então, qual a resposta para:  posso ser cronista?
Drummond foi e era poeta; Clarice foi e era ficcionista.  Machado,  Rubem Braga, Arthur Dapieve, Arnaldo Bloch, Veríssimo e tantos outros. Não os imagino e nunca soube que andassem  pela cidade procurando cenas pitorescas que, mais tarde, viessem a contar a história em que estiveram inseridos, as particularidades de uma época. Com exceção de Machado de Assis. 
Falamos do nosso tempo sempre, mesmo sem nos dar conta ou buscar por isso.
Tendo a achar que meu professor foi rigoroso demais com a crônica. Mas será que um ser desatento tem qualquer chance?
Pela teoria das multi inteligências de Gardner, algumas  pessoas têm inteligência mais espacial, outras mais lógica, outras ainda têm maior inteligência linguística. Não vou enumerar todas mas, o que me consola, é que há a inteligência existencial, a interpessoal e a intrapessoal.  Se por um lado o espaço exterior me escapa e não tenho a menor ideia de como se olha um mapa, por outro circulo bastante  bem no meu espaço interior e naquele que existe entre mim e os outros. E muita coisa acontece nesses cantos e recantos dignas de serem contadas para quem também se dispõe a se colocar em um ângulo imprevisível.
Então, pode se dar o caso das cenas serem ocultas, e não fotografáveis - literal ou metaforicamente?
Passíveis apenas de serem escritas?
Por certo que o processo será mais lento porque não haverá a ambientação “cênica” por assim dizer: o cenário. Terei de criá-la ou inventá-la a cada vez. Somente as palavras terão que dar conta de ambientar minha “cena” na cabeça do leitor.
Pensar nisso me dá um certo alento e a esperança de que não necessariamente ficarei aprisionada no meu lirismo besta, na exaltação eterna dos meus próprios sentimentos. 
Posso extrair cenas que me livrem do lirismo (des)comedido. Sinto até uma ansiedade " a priori". Que poder tem uma experiência!
Não há meio termo, nem caminho fácil, nem muito menos volta para a jornada que iniciei. Com ou sem respostas ( e tenho certeza que quando tiver alguma, as perguntas já terão mudado) seguirei procurando essa pulsão de vida que acabo de descobrir, o meu prazer, o meu gosto e o meu desgosto através desse bordado cheio de detalhes, linhas que se entrelaçam, frases que turvam, clareiam, tensionam, relaxam, cores que ora combinam, ora descombinam. Desenhos e pontos que o tornam delicado ou rude. Alegre ou triste. Esse ter como instrumentos agulha, linha e imaginação; esse igualar direito e avesso que é a competência máxima da bordadeira; esse querer surpreender é o que eu chamaria de querer tocar o coração do leitor. 
Às vezes de leve, outras nem tanto mas sempre recriando figuras que ele possivelmente já conhece e devolvendo, em forma de palavras e ideias, aquilo que ele dá tão generosamente: a vida ao redor.







domingo, 3 de março de 2013

Para quem gosta da verdade

Chegamos ao MAM. Adrina Varejão e seu universo nos esperavam. Nossa maior artista plastica, pelo menos na opinião de boa parte da crítica especializda.
Havia visto parte da sua obra em Inhotim, em belíssimo pavilhão só para ela. Um cubo em cima de um espelho d'água que reflete o cubo que reflete a água. Um jogo belíssimo. E não sei se ali Adrina se sente tão à vontade.
Chegamos, e nenhuma indicação de estacionamento. Pergunta daqui e dali paramos o carro.
Andamos um bom pedaço para chegar à bilheteria. Muito barato R$12,00. Que bom que assim muita gente pode vir, pensei.
Passada a bilheteria, começa o MAM, aquele espaço tão lindo a mostrar suas entranhas sujas, mal arrumadas, mal planejadas.
Diz uma moça que fazia as vezes de bilheteira: rasgo aqui seus ingressos e vocês passam por aquela última roleta que está quebrada. Ok é possivel que as roletas tenham estragado de última hora.
Pergunto:
- Tem um folheto da exposição?
- Não. Começa aqui em baixo e depois continua no segundo andar
- Obrigada
Nenhuma sinalização. Cada peça ao deus dará sem um mínimo pequeno texto explicando nada e depois de uma fila de três obras, papeizinhos colados na parede com seus nomes. A brincadeira era adivinhar se os nomes estavam de direita para a esquerda ou ao contrário.
Obras contundentes. Muito contundentes. Para Adriana não há aparência. É preciso ver por dentro. É preciso ver a verdade.
Atrás das paredes, emparedados mesmo, há toda uma realidade interna, visceral, normalmente escondida pelo branco dos azulejos.  Ponham as paredes abaixo e a verdade de cada família, de cada casa, seus segredos, suas verdades, suas mentiras, aparecerão. O Brasil colônia está alí. Vilipendiado. Roubado. mascarado.
Rasguem o mundo e as feridas sangrarão por todos os lugares.
Vejam um linda mulher e ela não é um uno formoso e sedutor: ela é pernas, braços, visceras, cabeça. Ela é corpo, espírito e intelecto. Esqueçam a aparência da linda mulher. Concentrem-se em suas partes feias bonitas, nojentas. O todo por fora não deve nos enganar.
Mesmo uma fruta nunca está inteira. Adriana a parte para saber o que há dentro. Carocinhos, cor vermelha. Dentro é diferente. Dentro é outra impressão.
Assim é o MAM. Lindo espaço, linda arquitetura. Podre.
Banheiros imundos. Um café que só tem exatamente isso: café. Nada para comer. Instalações e serviço pobres e sem qualquer alusão a estarmos em um espaço sagrado de arte.
Um museu sujo, um espaço feito de aparências.
Adriana Varejão sem querer está no lugar que complementa sua obra. Ela não precisou rasgar o MAM para escancarar suas entranhas. O MAM se escancara sozinho e nos deixa um gosto ruim de tudo de podre que existe atrás daquelas paredes.
Teremos muitos turistas. Temos uma população ávida por arte e cultura. Temos artistas fabulosos e um Museu de Arte Moderna que esconde a sujeira de tudo que é administrado pelos nossos secretários que, ao contrário da artista, imaginam que a aparência nos distrai e engana.
Rasguem-na, dilacerem-na, mutilem-na, esquartejem-na. E ficarão surpresos.