quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

A igreja se renova mas continua a mesma



Essa é a frase que mais tenho ouvido nesses tempos de renúncia de Bento XVI e em que se tem discutido os rumos e problemas da igreja católica apostólica romana.
E não me canso de pensar: renova-se para quem cara pálida? Para o papa que agora pode renunciar e desistir de carregar sua cruz, coisa que cristo não pode fazer. Nem eu e nem você. Temos que viver com nossas dores, nossas doenças incuráveis, nossa falta de dinheiro, de emprego, de comida. Temos que carregar  nossos políticos corruptos, nossas enchentes e tantas tragédias pessoais e gerais, diárias, sem trégua. Não podemos renunciar.
Renova-se para os padres pedófilos cujas punições e apuração dos fatos nunca ficam claros para mim. Renova-se porque não precisam mais usar batina e toda aquela roupa quente e pesada. Porque podem ser os reis da mídia, verdadeiros pop stars – cantar, escrever, fazer missas para milhares de fiéis. E tantas ouras “renovações”, a meu ver ,de caráter unilateral e de uma superficialidade a toda prova.
Continua a mesma para os gays, para quem quer fazer sexo por prazer, para quem quer se proteger de doenças sexualmente transmissíveis, para quem não quer ou não pode ter filhos.
Continua a mesma para julgar e acusar de pecadores todos, os adúlteros,  os fracos, os que comem demais, os que gostam de festas, os que não rezam, enfim, os que não seguem o que eles chamam de “a palavra” escrita numa bíblia que ninguém sabe quem escreveu – de tantos que nela meteram a mão de acordo com suas necessidades nos tempos em que, mesmo no ocidente, estado e igreja eram a mesma coisa.
Continua a mesma como se a bíblia fosse um fax mandado por Deus e a tal “palavra” viesse do céu e não dos homens. No antigo testamento então, nem se fala. A palavra de Jesus Cristo, mais recente, mais provável mas também muito adulterada e envolta em mistérios, também não podendo ser reinterpretada sob pena de irmos todos para o inferno.
Continua a mesma para nós mortais que devemos sofrer bastante nessa vida, esperando que a vida eterna nos traga todas as recompensas.
Continua a mesma para alimentar fartamente nossas culpas e  temores e criar as figuras disformes mortas de medo e de fome quase pedindo para morrer. Nunca renunciar.
Vejo a televisão o dia todo e me pergunto sem parar: que diabos todo esse cerimonial, essas roupas, esses prazos, essas regras, representam para mim, para você, para o mundo? E o anel de pescador? Símbolos que se misturam para nos confundir deliberadamente e nos fazer sentir pena do que apenas merece desprezo - para dizer o mínimo.
O que muda nas guerras, nas tensões, nas crises, na fome mundial se há um, dois ou mil papas ao mesmo tempo?
Porque torcer por esse ou aquele cardeal se já está dito que “a igreja se renova mas continua a mesma”?
Algo a esperar? Nada. Tudo leva a crer que se nenhum papa for eleito nem vai dar para notar.
A igreja não quer mudar e está fadada a acabar pelo menos nos moldes em que existe. É aritmético: saem mais fiéis do que entram, é só fazer a conta para calcular o tempo de extinção.
Eu me rejubilarei. 
Que Roma – ou o Vaticano especificamente, queime outra vez na própria fogueira de ganância, vaidade, corporativismo, preconceito e injustiça que criou.
Que o novo e, espero, último papa, seja o Nero moderno, louco, corajoso e performático que acabe com o  que os milênios fizeram apodrecer, com os ratos que passeiam impunemente nos esgotos das mentiras, dos segredos e das politicagens e a igreja católica apostólica e não romana, renasça descalça, sem dinheiro, generosa, amiga, piedosa e humana o suficiente para nos mostrar que todo humano é divino e, portanto, segue o rumo da perfeição. Queira ou não.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Calor





a chaleira com água foi pro fogo
a dona da chaleira esqueceu
a água ferveu ferveu ferveu
evaporou
o ferro esquentou esquentou esquentou
derreteu 



domingo, 3 de fevereiro de 2013

Letra para Luiz Tatit ( rsr)



Andava distraída pela vida
Mas estava tão distraída
Que olhava os espelhos e nem via como estava vestida
Me lembro apenas de uma ferida

Havia um gosto de despedida
Ao mesmo tempo uma certa sensação de estar perdida
Na minha mão um bilhete que era só de ida
Mas nem em sonho consigo ser mais precavida?

Serei sempre a Cláudia distraída?
Para onde seria essa partida?
E o sangue que saía da ferida?
Fechem a ferida! Fechem a ferida! Ela é doída!

Veio uma ventania e o bilhete que era só de ida
Voou e rodopiou e parecia rir de mim, me provocando uma corrida
Uma corrida alegre e longa que tornava minha pele mais e mais ardida no lugar da ferida
De frente para o sol, eu corria e queria meu bilhete só de ida

Fechem a ferida! Fechem a ferida ! Ela é doída

E ria, gargalhava, gritava e o bilhete me escapava até que um pé parou a algazarra nada comedida
Olhei para o pé que pisava meu bilhete só de ida.
Era pé de mulher e  muito conhecida
Muito conhecida mas eu, tão distraída, não reconhecia e fui até meio atrevida:
- solta meu bilhete só de ida que ele é a minha nova vida

E me ajude a fechar essa ferida! É muito doída

Não reparei que ela, ela me olhava reconhecida.
- Obrigada. Você nunca me deixou triste ou sentida 
Vou ajudá-la com a ferida!
E  eu, numa enorme e aflitiva queda livre lembrei:
- por isso meu bilhete é só de ida. Reconheço minha mãe e minha vida

Fechem a ferida! Fechem a ferida! Ela é doída!

Não sou mais distraída. Não estou mais dividida. Não tenho mais ferida
Minha miséria acaba aqui, onde acordo e me dou por vencida
Para que o novo destino que me veio inconsciente, finalmente me conduza pela estrada alegre
Da qual por muitos anos fui banida e cruelmente excluída

Fechem a ferida! fechem a ferida! Ela é doída!