Tenho pensado nisso motivada pelo fato de que
poucas pessoas estão como gostariam, observando o fenômeno de que sempre
queremos mais do que temos e que, no século xxi, tudo é líquido e nada dura; “que tudo que é
sólido desmancha no ar” e de que nada mais é
sólido: nem o amor, nem a generosidade, nem a amizade, nem os ideais,
nem o respeito pela vida. Mantidas as exceções que confirma a regra, claro.
Enquanto
tudo está bem ou ao menos administrável, nos sentimos vencedores, somos
altruístas, generosos, distribuímos sorrisos e palavras animadoras. Achamos que
todos deviam ver como é simples ser feliz, olhar o lado bom das coisas, transmitir
otimismo e tudo o mais que grite bem alto: EU ESTOU OK. VOCÊ TEM QUE ESTAR OK.
Mas a vida não é linear como nada na natureza.
Lineares só alguns modelos matemáticos. Não estou falando de tragédias terríveis como a perda precoce de seres amados, estou
falando de ter uma doença, perder um emprego, ter um casamento que de repente
ficou ruim, se separar, falir, deprimir, ter um filho problemático e outras tantas coisas maiores
ou menores que nos surrupiam a sensação de que está tudo bem.
Aí, cada um reage de um jeito. E me ponho a
observar. Me ponho a classificar eu diria. E confesso: tenho notado que essa
reação diz muito sobre cada um. Muito mais que o estar bem.
Há os que escancaram sua dor, como eu – já deu
para notar. Se encolhem na cama, ficam tristes de verdade, reagir é complicado,
se sentem como perdendo muitos pontos na vida. Não importa o que seja, a culpa foi
minha. E deus sabe quanto tempo isso pode durar. Mas essa tristeza não
envergonha, não diminui, não causa raiva do mundo nem do destino. Vive-se
triste, mas calmamente. Procura-se ajuda. Pede-se um abraço.
Há os que se envergonham sim. Não querem que o
mundo saiba do que não lhes deu certo. Se escondem não em casa, debaixo dos
lençóis, mas em si mesmos, fingindo que está tudo bem e vivendo por dentro, um
inferno por vezes dantesco que, na minha opinião, pode ser tão dolorido que se
materialize em doença – qualquer uma. Vivemos envoltos em matérias muito etéreas.
Quando essas matérias se tornam densas, aparecem no corpo em forma de doenças,
e essa densidade pode ter sido causada pela obsessão em torno do problema, a
vergonha e/ou a falta de expansão das energias – ruins e boas.
Há ainda os que exageradamente nos fazem pensar
que está tudo muito melhor do que apenas bem. Ficam eufóricos, contam muitas
piadas, bebem com os amigos, gargalham, e, esses sim, quase nos confundem, não
fosse a exuberância de seus gestos, seu falar alto, a atenção constante que
quase exigem dos outros.
Todos esses são suportáveis, às vezes mais
chatos, outras menos, podemos ter empatia, compreender, dividir. Mas,
infelizmente, existem os egoístas e autocentrados e, esses sim, por mais que contrarie nossa
índole, queremos distância da sua dor. Uma pessoa que perdeu uma perna, não se
torna menos amiga pela perna, mas pela auto piedade, pelo que supõe que merece
a mais, pelos direitos que se dá já que não tem uma perna. E se torna
insuportável, e não queremos contatos e
ela acredita que sabia que sem perna ninguém gostaria dela. Profecia auto realizável.
Por fim, do que tenho visto, há os arrogantes.
Não dividem a dor, ou se dividem é mostrando o quanto são fortes e de nada
reclamam, está tudo aparentemente bem, um ar blasé, algumas piadas, interesse
zero pelos outros e suas mazelas – assim como os anteriores só eles existem,
querem aplausos por serem estoicos e, repentinamente, se acham os únicos seres
importantes do mundo. O que você pensava que fosse amizade era um ato de uma
peça que, passada a cena do “tudo bem”, se transforma em descaso e numa cena de
“nunca te conheci”.
Deve haver mil outros tipos e nuances assim como
um sem número de misturas desses mesmos. Sou incapaz de descrevê-los todos, mas
tenho certeza que essas reações ao que deixa a vida menos bem sucedida revelam
e definem as pessoas: revoltados e tranquilos; invejosos e os que só querem o
bem de todos; confusos e assertivos; genuinamente
chatos e genuinamente legais haja o que
houver; amigos de sempre e amigos de ocasião; falsos e sinceros; transparentes
e opacos; do bem e das trevas; nefastos
e construtivos; bons e maus; amáveis e mal humoradas.
E, sinceramente, aqueles que
nem precisavam ter cruzado sua vida.