sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Festas

Nunca mais tinha sentido saudades da juventude. Nunca mais tinha me lembrado do quanto é bom ir a festas, me produzir toda, sonhar com o que acontecerá, sentir arrepios só de pensar em quanta gente interessante pode estar lá.
Estou  revivendo tudo isso agora. Com uma menina de 14 anos.
Eles me chamam de  “tia”. Mas não têm ideia de que a tia é igual a eles. Não posso deixar transparecer mas adoraria ir à festa com eles. Adoraria dançar até o sol nascer. Quero uma pulseirinha para entrar na festa! Me botem pra dentro por favor!
Eles pensam que os pais são diferentes. Como estão enganados!
Quero viver isso ainda! Quero ir a festas, me enamorar, seduzir, dançar muito, fazer o sucesso que fazia, me sentir o máximo, dormir sonhando, exausta....
Eu sou isso ainda.
Aliás, penso que o tempo não é absolutamente uma linha em que cada ponto sucede e apaga o ponto anterior.
Acho que o tempo é vertical, uma pilha de estados/tempo onde o mais atual deixa intactos os que já passaram.
A criança que fui continua existindo, a adolescente, a adulta..... cada uma dessas continua viva, como sempre foi e com as mesmas necessidades conscientes ou inconscientes. O tempo não apaga cada uma, o tempo acumula-as. Eu acho.
As minhas festas podem não ser iguais. Não tenho 15 anos Não sou mais tão romântica, mas ainda quero festas. Não sei por que tratei de esquecer aquela menina que adorava a ansiedade da espera, os preparativos, as risadas, a animação toda.
Resolvi isso hoje. Voltarei a dar festas. Voltarei a me divertir, a dançar, a exercer essa pedaço de mim que sou eu também.
Minha filha vai entender e adorar. Tenho certeza.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Fernando Pessoa again

Álvaro de Campos

Dobrada à moda do Porto

      Um dia, num restaurante, fora do espaço e do tempo,
      Serviram-me o amor como dobrada fria.
      Disse delicadamente ao missionário da cozinha
      Que a preferia quente,
      Que a dobrada (e era à moda do Porto) nunca se come fria.
 
      Impacientaram-se comigo.
      Nunca se pode ter razão, nem num restaurante.
      Não comi, não pedi outra coisa, paguei a conta,
      E vim passear para toda a rua.
 
      Quem sabe o que isto quer dizer?
      Eu não sei, e foi comigo ...
 
      (Sei muito bem que na infância de toda a gente houve um jardim,
      Particular ou público, ou do vizinho.
      Sei muito bem que brincarmos era o dono dele.
      E que a tristeza é de hoje).
 
      Sei isso muitas vezes,
      Mas, se eu pedi amor, porque é que me trouxeram
      Dobrada à moda do Porto fria?
      Não é prato que se possa comer frio,
      Mas trouxeram-mo frio.

      Não me queixei, mas estava frio,
      Nunca se pode comer frio, mas veio frio.

[RE] moer

Quem remói, não mói só uma vez, mói várias vezes: re-mói. Se uma coisa já está moída, para que moer outra vez e outra e outra?
Poderia dizer que gosto de fazer meu pão com farinha re-moída, que fica mais leve e mais fofo, que a vida para mim só tem sentido e graça se, depois de re-moídos e re-finados exaustivamente os sentimentos, as emoções e as ações ainda sobrar alguma coisa com que me alimentar.
Poderia afirmar mesmo que só quero me alimentar do que foi re-moído e purificado. Re-tirados todos os disfarces, as segundas intenções, as máscaras, as mentiras ainda que sinceras.
Mas como isso parece chato para o mundo!
Como, paradoxalmente, o  leve é o não re-moído, se possível sequer moído.
E aí fico sempre me perguntando:
Pensar nos sentimentos, na vida, nas pequenas ou grandes coisas é re-moer?
Sentir é re-moer?
Não querer ficar na superfície das águas que parecem profundas é re-moer? (claro que às vezes me engano e as águas são mesmo muito rasas)
É feliz quem não re-mói?
É chato quem re-mói?
Conversar sobre uma idéia não é já um certo re-moer?
Sobre o que falam as pessoas que não re-móem?
Não sei responder e  hoje essa pergunta está abismando minha noite.
Alguém me disse: “quem manda ficar remoendo coisas?”
E se ouvi isso é porque é assim que me vêem. É porque, para o mundo, ao re-moer estou dando  mais peso às coisas do que de fato elas têm e não o contrário. É porque devo ser uma chata que não sei me divertir e curtir a leveza da vida.
Como adoraria ser objetiva e reta! Zerar cada acontecimento tão logo ele passasse! Simplesmente não pensar mais. Ter a cabeça sempre voltada só para o que interessa e pode dar resultados mensuráveis. Não me perder em divagações inúteis. Não dar às pessoas nem um minuto a mais do meu tempo do que elas merecem (em geral nenhum minuto).
Adoraria não me olhar tanto, não prestar tanta atenção ao que sinto, de preferência nem sentir.
Adoraria ser outra pessoa?
Não sei, mas tenho certeza de que, se tenho alguma qualidade, ela certamente é o outro lado da mania de re-moer. Não existe moeda de um lado só.
Por isso, ao resolver o que quero mudar em mim, preciso de  muita sabedoria e coragem: vou mudar o que não gosto, mas junto irá embora todo o correspondente de que gosto, ao qual me afeiçoei e pelo qual me reconheço.
Vale a pena?
Logo eu, que adoro me perder para depois me achar?







terça-feira, 26 de outubro de 2010

Mrs. Dalloway

Estou meio sem tempo para escrever o que me vai pela cabeça - o que deve ser um alívio para muitos rs.
Mas não queria deixar passar em branco a releitura que estou fazendo dessa obra prima da Virgínia Woolf.
Quando a li pela  primeira vez, li tão rápido que sabia que uma hora teria que começar tudo de novo para saborear o que acho que posso chamar de LITERATURA na acepção mais elevada da palavra.
E ainda tenho certeza de que essa não será a última vez na vida que lerei o livro. Ele ainda me corta o fôlego e não consegui a calma e a atitude necessárias para tirar dele tudo que tem pra dar.
Não há palavras que definam a profundidade e a relevância de cada frase do livro.
Nada é por acaso, gratuito. Tudo é  desesperadamente importante, cheio de significados e ao mesmo tempo angustiante e  fatal.
Falar da competência dessa escritora é uma bobagem. O que ela me faz pensar é de onde surge um talento tão gigantesco que a faz percorrer quase todos os sentimentos humanos em apenas um dia da vida de uma mulher?  A que tipo de ser humano ela pertence? De onde lhe vêm as palavras, as frases que nos fazem parar de respirar, os personagens tão profundos e cheios da vida e da morte de todo mundo? Impossível saber e impossível não morrer de inveja.
Quem gosta de ler não perca. Mas prepare-se para entrar em um patamar perturbador de literatura magistral e correr o risco de ler esse livro para sempre e nunca mais ter a respiração normalizada. Ficar aprisionada como eu fiquei   Vale a pena.
Mrs Dalloway é um presente que ela nos deixou que pode estar além das nossas possibilidades de compreensão. Essa mulher que acabou cometendo suicídio e nos privando de sabe lá quantas obras magníficas. Ou não. 
Exauriu-se nos livros que escreveu e não viu mais por que continuar.























terça-feira, 19 de outubro de 2010

Reflexão emprestada

"Quando a sociedade humana cumpre o dever na sua verdadeira função as pessoas que a formam intensificam cada vez mais a própria liberdade individual e a integridade pessoal. E quanto mais cada indivíduo desenvolve e descobre as fontes secretas de sua própria personalidade incomunicável , mais ele pode contribuir para a vida do todo. A solidão é necessária para a sociedade como o silêncio para a linguagem e o ar para os pulmões e a comida para o corpo. A comunidade, que procura invadir ou destruir a solidão espiritual dos indivíduos que a compõem, está condenando a si mesma à morte por asfixia espiritual.

A solidão é tão necessária , tanto para a sociedade como para o indivíduo que quando a sociedade falha em prover a solidão suficiente para desenvolver a vida interior das pessoas que a compõem, elas se rebelam e procuram a falsa solidão. A falsa solidão é quando o indivíduo, ao qual foi negado o direito de tornar-se uma pessoa , vinga-se da sociedade transformando sua individualidade numa arma destruidora. A verdadeira solidão é encontrada na humildade, que é infinitamente rica. A falsa solidão é o refúgio do orgulho e infinitamente pobre. A pobreza da falsa solidão vem da ilusão que prentende, ao enfeitar-se com coisas que nunca podem ser possuídas, distinguir o eu do individuo da massa de outros homens. A verdadeira solidão é sem um eu.

Por isso é rica em silêncio e em caridade e em paz. Encontra em si infindáveis fontes do bem para os outros. A falsa solidão é egocêntrica. E porque nada encontra em seu centro, procura arrastar todas as coisas para ela. Mas cada coisa que ela toca infecciona-se com seu próprio nada e se destrói. A verdadeira solidão limpa a alma, abre-se completamente para os quatro ventos da generosidade. A falsa solidão fecha a porta a todos os homens.

Ambas as solidões procuram distinguir o indivíduo da multidão. A verdadeira consegue, a falsa falha. A verdadeira solidão separa um homem de outros para que ele possa desenvolver o bem que está nele e então cumprir seu verdadeiro destino a pôr-se ao serviço de uma pessoa."
 
Pensamento de Thomas Merton, monge católico, escritor e poeta                                                                                                 

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Tentar viver bem é uma gincana impossível de ganhar!

Gosto de dar uma olhada nos modismos que estão rolando de um modo geral. Entre eles, o que a galera vem inventando sobre formas de viver bem.
Assim, gravo os programas Alternativa Saúde, um programinha besta de 30 min que não se aprofunda em nada do que fala e de vez em quando vejo vários de uma vez.
Acho um desaforo programas da TV paga terem tão pouco conteúdo já que somos nós que pagamos e não os anunciantes. Mas quem sabe as pesquisas mostrem que as pessoas querem isso mesmo, pinceladas de qualquer coisa....vá saber.
Numa dessas madrugadas vi uns 5 programas e fiquei pasma!
Imaginem o que se tem que fazer para viver bem (de acordo só com 5 programas):
1 – Como estamos todos muito estressados e com dificuldades de botar o pé no freio um designer loiríssimo, lindo e jovem criou o que ele denominou o Clube do Nadismo: um lugar onde você vai para não fazer nada! Tem 7.000 sócios no mundo e várias sedes. Agora você veja, para não fazer nada você tem que pegar seu carro, provavelmente pegar um trânsito, se matricular, pagar, ter que se relacionar com gente que você nem sabe quem é...e isso é não fazer nada! Eu, sentar aqui na minha varanda e ficar olhando  a chuva cair não deve servir....
2- Agora que você aprendeu a não fazer nada e relaxar, você está pronto para ser um vencedor. Mas não pense que é simples! Tem que fazer um coach com Nuno Cobra que diz que para ganhar você não pode pensar em ganhar! Um verdadeiro vitorioso não pensa nisso, apenas faz. Aí a coisa começou a complicar pra mim mas claro que a Patrícia Travassos fazia aquela cara de conteúdo e estava tudo entendido.
3 – Mas um aspirante a vencedor, tem que, antes de tudo, vencer seus medos, traumas, desfazer seus nós internos...aí entra a bioenergética. Sessões básicas para soltar os bichos e ainda com a promessa de ajudar a resistir às tentações! Ok, respeito. Criada a partir das teorias de Reich, discípulo de Freud. Mas o programa não explicava nada sobre as tais tentações e outros excessos.
4 – Vencidos os medos, não está tudo conseguido. É preciso ter elegância, reflexos rápidos, saber se defender e atacar no momento certo. Que fazer? Esgrima claro! Aulas de esgrima podem mudar sua vida!
5 – Ainda mais se você combinar com aulas de dança de Martha  Grahan (uma técnica de dança  moderna que ajuda a encontrar seu eixo, se conhecer, conhecer sua respiração).
Aí sim! Se sobreviver e tiver tempo, você estará pronto para encarar os desafios da vida sem perder a pose nem a deixar a pressão subir!
Ah ia me esquecendo: se você ficar encafifado entre duas escolhas, não se apavore, um bom astrólogo pode ajudar muito.
Agora, só um detalhe, tudo isso só serve para a magérrima e linda Cynthia Howlett. Porque a gordinha psicóloga Tereza, de 104 kgs que se dispôs a emagrecer 30 diante das câmeras, esta passou os 5 episódios suando muito no spinning, na hidro-ginástica, na musculação...glamour zero. Muitas gordurinhas, cabelos suados, enquanto Cynthia fazia seu ballet, sua esgrima e sua bioenergética qual uma sílfide de cabelos ao vento....
A vantagem de gravar um programa é que você pode adiantar os intervalos e aí de 30 viram 15 min e eu só perdi 75min da minha noite. Uma hora e 15 min de insultos à minha inteligência que eu aguentei sem reclamar e ainda dando risada. Bem feito!

domingo, 17 de outubro de 2010

O que me faz feliz - parte II

Entre um post e outro fui caminhar na Lagoa e, claro, segui pensando nas pequenas felicidades de todo dia.
Lembrei de mais um monte:

  •  ter a Lagoa tão perto e ela ser tão linda que por mais que a gente se acostume não se acostuma nunca!
  • entrar na banheira quente e cheia de espuma de noite quando estou  exausta e com a perspectiva de deitar cheirosinha debaixo do edredon com o quarto a 21 graus e assistir a uns 3 episódios de House que deixei gravando...uiii
  • assistir o Jornal da Globo e o Globo News Painel só porque sou tiete (beirando a paixão) do William Waack - aquele homem enorme, sério mas com uma covinha no queixo que ameniza a seriedade, um olhar meio blasé de quem está criticando por dentro tudo que está dizendo, e um sorriso forçado, porque alguém da direção deve implorar para  que ele sorria mais mas ele não consegue....
  • praia, caranguejo e cerveja gelada
  • horário de verão
  • passar noites de insônia baixando e escutando músicas que gosto e ai de mim se tiver que acordar cedo no dia seguinte
  • dormir de tarde
  • não cumprir um dever
  • rever filmes
  • reler  livros
  • pipoca
  • comer brigadeiro de colher (isso me deixa culpada o que estraga um pouco a felicidade)
  • contemplar um quadro que me emocione (nem que seja folheando meus livros de museus). Ao vivo então nem me fale!
  • adiar uma tarefa chata
  • emagrecer nem que seja 1 kg
  • beijar na boca
  • e, atualmente, me expor completamente nesse Blog
Por que mesmo sou infeliz? 
Esqueci.

\

O que me faz feliz

Sempre que ouço a voz do Gilberto Gil na propaganda do Pão de Açúcar, tenho vontade de responder a ele o que me faz feliz. Se não dá pra ser para o Gil, aqui vai sem compromisso com a ordem ou com a importância.

Acordar domingo de manhã, pegar os jornais na porta, um café, um cigarro e ter a perspectiva de não fazer nada o dia todo a não ser ler jornais e revistas e  tomar um café da manhã que pode durar até de noite....felicidade!

Fazer exercícios..caminhar, correr, levantar ferro....qualquer um. Sentir cada célula trabalhando, envolvida naquela atividade...Às vezes cansa ou dói na hora mas depois....

Início do mês: ir à banca de jornal comprar Bravo, Gosto  (embora não cozinhe nada), Women’s Health ... Leitura deliciosa para uns dois dias!

Ficar deitada de noite na cama com a minha filha, jogando conversa fora ou melhor ainda, vendo um filme de terror  em que nós duas gritamos e rimos muito!!!!
E por falar nisso, a mais doce de todas as felicidades, a  mais diária, a mais misteriosa e simples ao mesmo tempo: ver essa menina crescer, se transformar em mulher, saber dos seus sonhos, vê-la  se apaixonar, sofrer, pular de alegria, ter dúvidas, comprar sapatos de saltos altíssimos que nem eu me atreveria... reconhecer nela um "eu" inteiro e em constante transformação!

Ler um bom livro. Mas bom mesmo. Daqueles que seqüestram a gente, que nos abduzem....Que quando termina a gente sente saudade dos personagens, pensa como eles e vive como eles até que a lembrança vá se desvanecendo e a gente coloque outros no lugar.

Arrumar a casa. Comprar flores, cheirinhos, um novo adorno....Nem estou falando de manter a casa super arrumada. Essa ideia de ter uma casa como se fosse uma foto de revista já me deixou há muito. Gosto de uma certa bagunça que parece dizer: “aqui se vive”.

Pesquisar e estudar coisas novas. Tão fácil agora com a Internet né?  Pode levar o tempo que a gente quiser e tiver pra investir nisso. Desde procurar uma dieta ou receita novas até ler Platão!  Um luxo! O céu é o limite e a felicidade também! Se perder em labirintos de Blogs que você nunca viu e surpreendem, ler poesias de quem quiser...não precisar ficar aflita porque é madrugada e você queria tanto ler Drummond e as livrarias estão fechadas!

Fazer um workshop ou palestra em que você e os participantes viram um só. Em que há perfeita sintonia. Aliás acho que a melhor coisa do meu trabalho é essa possibilidade de viver muito frequentemente o “aqui e agora”, sem passado nem futuro interferindo. O ser inteiro concentrado naquele momento, numa tensão e atenção boas. Buscando respostas em arquivos mentais pouco acessados, tentando descobrir e perceber o que cada um está pensando. Interagir sem limites! Uma felicidade!

Conversar longamente com amigos e/ou amigas. Rir, muito. De qualquer coisa. De recordações, novas histórias, comentários engraçados sobre o mais banal. O afeto permeando tudo.

Ir  a Belo Horizonte! Sentir aquela coisa que só Caetano e eu conhecemos. Ele, na Ipiranga com a São João, eu na  Afonso Pena. Belo Horizonte me faz a mais feliz das criaturas. Parece que o melhor da minha vida, as raízes do que me tornei estão em BH. E todas as pessoas que mais amei,nem todas vivas hoje, de qualquer modo estão lá.

Claro, um passeio! Ver montanhas, relevos diferentes, verdes diferentes, o mar! Ah um mergulho no mar, de preferência numa praia linda, limpa e vazia...

Pronto, comecei a entrar em felicidades mais distantes e queria só falar das acessíveis de todo dia.

Mas quem deixaria de fora uma longa viagem por lugares exóticos estando apaixonada?

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

A Cisão


Tenho pensado muito na vida e na morte. Não como coisas ou estados definitivos (isso seria fácil), mas como impulsos para os quais nos jogamos percebendo ou não, querendo ou não.
Sem querer ser mórbida, tenho reconhecido que sou muito mais afeita e próxima da morte que da vida.
Nem de longe sou suicida ou atraída pela morte como fato real – sei esperar a minha hora. Mas hábitos que tenho, estados de espírito, forças que me tomam têm muito mais relação com a morte que com a vida.
Não sei se acho banal ser feliz. Se acho que a morte, enquanto vida às avessas, é mais sofisticada, mais profunda, exige mais de nós seres humanos que a felicidade.
Tenho muito medo de falar essas coisas porque ser infeliz está totalmente fora de moda, assim como fumar ou  morrer de tuberculose.
Por outro lado, tenho uma enorme pulsão de vida. Tenho uma natureza alegre, otimista, tenho ímpetos de construir tão fortes como os de destruir.
Sou um ser cindido. Sou duas.
Todo mundo é?

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Rejeição ou indiferença

Se eu tinha dúvidas de qual sentimento é o mais devastador, não tenho mais. Bato martelo, jogo braço de ferro ou aposto uma corrida: é a indiferença.

Abismo

Poetas e filósofos estão em montanhas diferentes olhando para o mesmo abismo.

Monica Pontalti, uma amiga querida


Eu vivo dizendo que há pessoas que sabem tirar o melhor que a gente tem e outras que só soltam os nossos monstros.
Essas últimas são as pessoas que nos fazem sentir inseguras, menores, as que nos julgam – em geral mal, as que dizem sobre tudo o que fazemos que haveria um modo melhor de fazer, as excessivamente sinceras que não se incomodam nem um pouco se estão nos machucando ou não e nem questionam se tamanha sinceridade é mesmo construtiva, se saberemos o que fazer com ela, ou se é pura maldade para que nos sintamos mesmo péssimas de posse daquela informação gratuita.
Aqueles que são capazes de dizer, durante uma festa, que seu vestido não lhe caiu bem e deixar você a festa inteira querendo sumir sem nada a fazer para salvar a situação.
A que vêm essas gratuidades?  Dá prá imaginar quantas situações no mínimo desagradáveis pessoas assim são capazes de criar?
Todos esses comportamentos e atitudes, claro, machucam, diminuem e, provocam sempre, em algum momento, um movimento de vingança e revide  mesmo não sendo consciente (porque em geral nos recolhemos na nossa dor). E é aí, que os monstros aparecem.
Pessoas como eu, que tentam ao máximo ser gentis e não magoar ninguém de graça, têm monstros muito camuflados e sutis e nem por isso menos assustadores. Sei perfeitamente quando estou sendo má mesmo que só eu saiba disso.  E a minha maldade é cortante como uma navalha e detesto quando ela aparece.

Por outro lado, graças a Deus, existem aquelas pessoas cujo jeito de ser, de viver, suas crenças e leveza interna, só nos fazem colocar prá fora o que temos de bom.
Tudo isso para falar de uma grande, querida e necessária amiga: Monica Pontalti.
Essa que sempre comenta meus posts, que me dá força em todos os momentos, que tem uma palavra legal para tudo – nem que seja receitar própolis e chá de boldo...rsrs.
A Mônica é uma acidente na vida. Uma pessoa rara. É especialíssima, diferente, honesta, reflexiva sem no entanto alimentar minhas angústias e estranhamentos.
Mônica me inspira para a vida. Por pior que esteja, nossas conversas que começam sérias acabam em gargalhadas monumentais porque ela tem o dom de me fazer rir das minhas próprias mazelas e de me fazer não me levar muito a sério.
Não julga, não desconsidera meus sentimentos, não desqualifica minhas aflições.
Apenas tenta dar a eles a  devida dimensão e me fazer ver que o bom da vida é nossa amizade, nossos projetos, nossos papos e toda a teia de relações que de um jeito ou de outro são influenciadas por nós.
Não há problema que ela não tente genuinamente ajudar a resolver.
Depois de conversar com ela, sempre saio mais leve, mais otimista, mais alegre e com vontade de fazer coisas  boas por mim e pelos outros. É o que chamo tirar o bem de dentro das pessoas.
Só para completar, queria contar que, ainda por cima, trabalhamos juntas em muitos projetos. Com todas as nossas diferenças, dá para imaginar o quanto já deveríamos ter nos desentendido,  mostrado irritação ou até mesmo nos engalfinhado?  Sim porque não foram poucas as situações tensas porque já passamos. Nunca aconteceu. Respeitamos nossos jeitos, nossos tempos, torcemos uma pela outra, nos ajudamos, nos fortalecemos. E, sobretudo, rimos muito. Rimos de tudo e de nada. Apenas rimos.
Não é à toa que digo que a casa dela tem Lexotan. Basta pisar lá, já me sinto mais relaxada, calma e mooortaaaaa de sono rsr. Deitar no sofá enquanto trabalhamos não tem preço!
Menos preço ainda tem fazer uma amizade dessas na maturidade. Me sinto abençoada por isso.
Agradeço todos os dias e espero, cada vez mais, saber e merecer me cercar só de pessoas assim. Iluminadas!


domingo, 10 de outubro de 2010

Uma forma de sabedoria

Tenho uma grande e querida amiga de infância que além de muito inteligente, sempre foi reconhecida como uma pessoa muito prática.
Nos conhecemos aos 11 anos e passamos nossa adolescência entre gargalhadas e estudos, sempre nos divertindo mais que estudando mas conseguindo as boas notas que nos davam ótima reputação na escola.
Acabaram os anos dourados, cada uma seguiu sua vida, casamos ambas, nos separamos também, deixamos de nos ver por longos períodos, outros estivemos muito próximas. Por uma dessas coincidências da vida hoje moramos muito perto e nos vemos mais frequentemente.
Ela sempre foi das pessoas mais focadas que já conheci e , claro, está super bem profissionalmente, é uma executiva de sucesso, dois filhos rapazes e uma energia, uma alegria, de dar inveja a qualquer mortal.
AH! E nunca está sozinha. Sempre namorando, indo a festas, cinema, teatro, almoços, jantares.
Eu, claro, sempre me espanto porque isso é o oposto de mim e um dia perguntei a ela como era possível que ela sempre encontrasse homens que valessem a pena a ponto de nunca estar sozinha.
Ao que ela me respondeu:
- Depende do que você chama de valer à pena. Nunca procuro tudo de que preciso numa  pessoa só. Seria impossível achar.
E foi desfiando suas necessidades:

-Intelectuais, tenho meus amigos;
-Viagens, tenho meu trabalho que me proporciona estar cada hora em um canto do mundo;
-Dinheiro, eu tenho, não preciso do de ninguém;
-Ter meu tempo sozinha não é problema: geralmente durante a semana não encontro o namorado, fora os longos períodos viajando;
-Conversas íntimas e profundas, conto com minhas amigas
- Para minhas queixas, angústias e indecisões da vida, tenho minha analista!!!!

Assim, as únicas exigências, se podemos chamar assim, que ficam para o namorado é ser afetuoso, dar um colinho (de que quase nunca ela precisa), terem afinidades sexuais, gostarem da companhia um do outro, sem jamais quererem que o outro fosse diferente.
Não parece perfeito? Não parece o jeito mais inteligente e real de se relacionar com a vida e com as pessoas? Esperar de cada uma o que ela pode dar e estar perto de quem supre nossas necessidades daquele momento?
Porque haveríamos de querer que uma amiga sem religião nos levasse à igreja? É querer inverter a ordem das coisas e invariavelmente....nos decepcionar.
Há uma amiga certa para cada assunto, uma companhia mais adequada  para cada programa ou viagem, e um namorado a quem podemos entregar o nosso melhor sem fazer cobranças e exigências porque estamos “plenas”. Claro, com a plenitude possível. Ninguém mais na nossa idade acredita em contos de fadas.
Muito sábio  na minha opinião mas difícil de colocar em prática se você não é ela.Mas não custa pensar no assunto e tentar se for o caso.
E digo mais, deve estar dando muito certo porque outro dia vi no Facebook dela:
- “Não tenho tempo para nada. Ser feliz me ocupa todo o tempo!"

Domingo de manhã!

Pensando nas escolhas de cada um, na solidão que 'as vezes nos acomete, entendo que o grande problema é que todos somos cheios de desejos. Essa é a marca registrada da nossa existência emocional, que pode nos levar 'a nossa ruína e 'a dos outros.
Sabendo ser Platão, o autor do maior tratado já escrito sobre o desejo, fui lá. O Banquete!
Platão descreve um jantar no qual o dramaturgo Aristófanes conta a história mítica que explica porque temos esse anseio tão profundo pela união com o outro, porque estamos sempre 'a procura do par perfeito. Como já tínhamos o parceiro costurado no próprio tecido do nosso ser, éramos todos felizes, não sentíamos falta de nada- éramos inteiros. Só que essa inteireza, nos tornou orgulhosos e deixamos de adorar os deuses. Zeus, então, nos puniu e impôs 'a humanidade a mais dolorosa condição humana: a sensação constante de que não somos inteiros e pelo resto da eternidade nasceríamos sentindo que faltava alguma coisa - e que essa parte que faltava estava por aí, girando na forma de outra pessoa.
Ah, menina, a realização desse sonho de completude pelo amor, nos avisou Aristófanes, seria impossível. Sabe porque? Como espécie, estamos despedaçados demais para algum dia nos consertarmos com uma simples união - a união sexual pode nos tornar saciados e completos, temporariamente... 'As vezes, podemos até acreditar que achamos a outra metade, mas o mais provável é que tenhamos achado alguém em busca da sua metade, algúem igualmente desesperado para acreditar que encontrou em nós a completude. Portanto, imagino que acima de tudo, o caminho é mesmo saber conviver bem com a própria solidão, não esquecendo da leveza que nos fará aptos aos encontros . O melhor ainda está por vir...

Querida, obrigada pelo quase-irmã. Beijo

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Escolhas


Sexta-feira. Noite. Véspera de feriado. Sozinha.
Filha de 14 anos já sai sozinha, volta a hora que quer.... eu que achava que esse tempo nunca chegaria...
Ser ou estar sozinha é uma bênção quase sempre. Pensar, trabalhar, dormir  a hora que der na telha, ouvir música, cantar bem alto: são coisas que sozinha vão muito melhor.
Assistir Dr House compulsivamente sem ter que explicar a paixão por um personagem! Não tem preço.
E não ter que avisar a ninguém quando você vai trabalhar até mais tarde? Ou resolveu ir beber com os amigos?
Deixar a casa uma bagunça o tempo quiser, alugar o telefone, ficar horas no computador, falar e escrever no Facebook, no Blog....ah! tem que ser sozinha!
E nos dias em que não quer conversar? Quer só se embolar no edredon e ficar muito zangada com você mesma porque comeu demais, porque não foi à academia, porque não cumpriu sua agenda. Qualquer pessoa seria um transtorno.
Mas e hoje? Que queria ter uma companhia especial? E hoje que estar sozinha está me matando?
Todas as bênçãos de todos os dias compensam esse rombo na alma de hoje?
Ou será que fui eu que nunca encontrei-  ou não soube negociar,  uma companhia que me desse todos os espaços e ainda ficasse comigo sexta, noite, véspera de feriado?
Não, acho que não tem isso. É escolha. Você leva o pacote inteiro qualquer que seja a opção: negociar, ceder, não fazer o que quer do fundo do seu coração se quiser ter alguém. Ou ficar  sozinha quando não queria, não ter um parceiro para o sexo, para o choro, para as gargalhadas (a melhor parte...juro. é  disso que sinto mais falta), ter que beber sozinha seu espumante, achar o que fazer para não se matar...se a opção for  ser sozinha.
Eu resolvi ser  sozinha. Assim, bebo, fumo , escrevo, sofro, choro, ouço música...é o preço!  Pago sem muita dor sabendo que amanhã será outro  dia e não sentirei mais falta de ninguém.
Mas o que é isso que estou dizendo? Nunca mais paixão? Nunca mais entrega? Nunca mais falta?
Eu não sei responder isso agora, estou um pouco bêbada. Mas se tiver que ser assim, assim seja. Já vivi tudo isso com muita  intensidade. Não devo nada para a vida nem ela me deve. Estamos quites até o momento.
Mas que deveria haver um jeito de as duas coisas coincidirem lá isso deveria. Que bom ser você mesma sempre, o outro ser o outro e ainda poder haver amor e entendimento!
Vou confessar  um sonho: ter alguém de quem eu pudesse dizer; “nos damos tão bem um com o outro que nunca pensamos um no outro: como as mãos esquerda e a direita.”
Não quero menos que isso.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Uma prece, outra homenagem


Hoje tenho vontade de rezar. Acho que sei porque mas não vem ao caso agora. Não uma prece qualquer. Teria que ser algo diferente.
Tenho minhas orações que me servem como uma luva quando minha alma precisa delas. Mas tem que precisar mesmo. Uma prece mecânica não serve ao seu propósito.
Aí me lembrei de uma das mais lindas preces que já li na vida. Escrita por Clarice Lispector, musa inspiradora, eu acho, de todos os que têm a pretensão de tentar sondar a alma humana e mais ainda de escrever sobre ela.
Fui procurar nos meus livros e...achei!
Quem conhece a minha casa sabe o lugar desproporcional ao tamanho do espaço que meus livros ocupam. Ou o que sobrou deles. Porque não existe só o mistério do desaparecimento das meias. Há também o do desaparecimento dos livros! A gente empresta e, claro, livro emprestado é livro dado. Tem as viagens e os esquecimentos, sem contar as inúmeras mudanças de casa quando acho que lá se vão outros tantos.
Mas enfim...boa parte dos que marcaram a minha vida ainda estão aqui e não há prazer maior que me lembrar de uma passagem marcante,  não saber onde foi que li, folhear a esmo, tomar muitos rumos não previstos, ler coisas das quais nem me lembrava mais, me perder em labirintos esquecidos no fundo da memória e finalmente, achar! Isso pode levar um tempo que não sei contar. Horas? Madrugadas? Boa parte da vida? Não sei nem me importa.
Assim foi que achei a prece de Clarice que de tão linda quero compartilhar com todos os meus queridos amigos

“Alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma, pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém.

Um beijo muito muito carinhoso 

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Rejeição

Não é porque minha pesquisa só teve um voto e, portanto, 100% dos meus leitores escolheu a rejeição como o sentimento mais devastador, que não vamos falar dela.
Confesso que estou com muita dificuldade. Não é minha praia elaborar qualquer tipo de auto-ajuda para os que  ficam muito mal quando rejeitados.

Rejeição.

Parece fácil. Quem já não sentiu? Quem não sabe o quanto é horrível, o quanto dói? O quanto tem a ver com a perda de nós mesmos e não do outro?
Mas vou tentar ir mais além.
Sentir dor porque alguém que amamos nos deixou é para lá de normal e a forma como lidamos com isso é que  pode ser normal ou  não: transformar a perda em uma tragédia não é um sintoma muito saudável e pode ser uma forma de a gente perceber o quanto não é o outro que importa, mas nós sem o outro, o que nos dá uma boa dimensão da pobre auto-imagem que construímos para nós mesmos. Não existimos sem o outro e daí tantas mulheres mal tratadas aguentam seus maridos agressivos, tantos homens suas mulheres dominadoras e desprovidas de verdadeiro afeto.
Mas essa é a parte fácil.
A difícil, no meu entender, é pensar nas pessoas que se sentem rejeitadas mesmo quando não são. Quer dizer, aquelas que nem amavam tanto assim mas se o outro vai embora entendem como rejeição. Aquelas que odeiam o emprego que têm mas se forem demitidas sentem enorme rejeição. E por aí vai...amigos, filhos....Qualquer resposta atravessada ou evasiva é já uma rejeição insuportável.
Para esses casos fui pesquisar um pouco e encontrei duas coisas no mínimo muito interessantes: de um lado um estudo super moderno em que a pesquisadora, mapeando o cérebro, conclui que o as áreas ativadas no cérebro pelas rejeições amorosas são as mesmas da motivação e recompensa, ou seja, as duas coisinhas que produzem os vícios.

Diz a pesquisa: “É possível ficar viciado na rejeição amorosa? Para a antropóloga Helen Fisher, a resposta é sim. Grande parte do sofrimento e da angústia causados pela rejeição podem estar associados a uma área específica do cérebro, afirma a cientista da Rutgers University, nos Estados Unidos.”

Não me aprofundei muito mas já é um dado a mais: podemos nos “viciar” nas dores da rejeição segundo esse estudo.

De outro lado, encontrei ajuda no que há de mais antigo no mundo: a mitologia grega.
Sempre me atrapalho com esses mitos, suas histórias são tão confusas e cheias de símbolos que leio e depois me esqueço de tudo.
Mas está tudo lá, até mesmo o vício da rejeição! Senão vejamos:

Medusa tem uma história para lá de complicada. Mas o fato que importa aqui é que foi rejeitada pelo Deus a quem amou quando era bonita e sedutora. Na vida real, essa rejeição original pode ser (e normalmente é) da mãe cujo primeiro olhar molda definitivamente nossa auto-imagem.
Transformou-se  então (por vingança da Deusa com a qual disputou o marido)  na famosa mulher com cabelos de serpentes, presas de javali, asas de ouro e mãos de cobre. Ou seja, uma mulher monstro que não podia beijar, acariciar. Impedida de dar afeto. E pior, ninguém podia olhá-la sem ficar paralisado e...morrer.
Vejamos se os que amplificam as rejeições não têm um pouco de Medusa. Se suas profecias não se auto-realizam,
Medusa não quer morrer, quer ser amada, mas sabe que paralisa a todos os que olha. Quem está paralisado não pode amar de verdade, nem se expandir, nem criar, nem ser uma pessoa completa.
Vai daí que Medusa de novo é rejeitada pelo “paralisado”em questão e a vida prossegue numa sucessão de rejeições que só a própria medusa pode parar.
Ou esperar que algum Deus a mate simbolicamente (como na história original) e liberte toda a sua pulsão evolutiva e criadora (esta era a verdadeira essência de Medusa que ficou paralisada quando se transformou em um monstro).
Só para terminar, vale lembrar que o Deus que a matou também tinha sido rejeitado, mas havia conseguido transformar a rejeição em amor, perdão e muito afeto.
Desconfio que as Medusas modernas precisem finalmente de um parceiro muito amoroso que consiga colocar um espelho em sua frente para que elas se vejam como são e se paralisem a si próprias e morram para construir uma nova história.
De qualquer forma, o “estar condenada a paralisar” e consequentemente  ser rejeitada não se parece com o vício da Doutora Fisher?
É fascinante a ciência ficar atrás de provar coisas que os homens sempre souberam, desde a mais remota antiguidade.
Beijo  ao (à) único (a) rejeitado(a) que teve a coragem e o interesse  de responder a pesquisa. Sei que não ajudei muito mas quem sou eu para ajudar?  Nosso propósito aqui é tão somente REFLETIR! Concluir é outro departamento que não nos compete! Aliás, a quem competiria?

Em tempo: como Medusa é um mito mulher, ficou mais fácil falar para o gênero feminino. Mas tudo se aplica aos "Medusos" também, é claro.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Aeroportos e outras esperas




Sou frequentadora assídua de aeroportos. Muito mais do que gostaria para falar a verdade.
Que saudade dos tempos em que embarcávamos atravessando a pé as pistas até a porta do avião! Sobretudo no Santos Dumont onde a paisagem é estonteante: sol a pino, óculos escuros lembrando Jackie O., ou guarda-chuvas lembrando Casablanca. Puro glamour em um ou outro caso. Naqueles momentos não dava para continuar pensando em nada. Eram uma pausa para o encantamento.
Hoje aeroportos são uma tortura: nenhuma paisagem, nenhum ar, um eterno sobressalto. Nunca sabemos se vamos estar no horário e quais serão as inevitáveis  mudanças  de planos: portões de embarque,  horários, se o voo sai ou não sai.
Mas quem não tem outra alternativa, tem que achar modos de sofrer menos nos aeroportos. Eu, em geral, tenho dois dependendo da ocasião e meu estado de espírito: ler ou observar as pessoas.
Ontem cheguei em Confins com mais de 2 horas de antecedência para o meu voo. Estava exausta e sem a menor vontade de ler.
Me aboletei em uma mesa de bar ( Confins tem isso de bom) e pedi uma cerveja. Me pus a observar as pessoas em volta.
Todas as mesas ocupadas quase sempre por uma única pessoa, todos provavelmente na mesma situação que eu. Computadores abertos, celulares a todo vapor, uma cerveja na frente.
Como é difícil não fazer nada! Como é difícil contemplar, deixar o tempo passar sem pressa, sem ansiedade, sem sensação de estar perdendo alguma coisa!
Não estou me excluindo. Tenho a mesmíssima dificuldade e olhando os outros, pensava se não deveria estar respondendo e-mails, adiantando algum trabalho, e sim, não resisti e saquei do meu BlackBerry para olhar as fotos que minha filha recém tinha  colocado no Facebook.
A tecnologia tem disso: nos proporciona incontáveis formas de passar o tempo e nos tira totalmente a oportunidade impagável de  relaxar já que não há o  que fazer a não ser esperar.
Porque esperar é tão ruim? Porque os tempos de pausa entre dois eventos nos colocam em situações praticamente de pânico e  total impotência?
E não estou falando só das esperas do dia a dia. As às vezes longas esperas da vida são difíceis também. Esperar o momento certo para agir, esperar a hora de estarmos prontos para um novo desafio ou projeto, esperar por alguém que um dia chegará.
Definitivamente não fomos treinados para esperar. Fomos treinados para agir e isso nos faz, não raro, atropelar o tempo, meter os pés pelas mãos, agir fora de hora e estragar tudo.
Aproveitar nossas pequenas esperas para exercitar esperas maiores pode ser um bom modo de criar estratégias, refletir e aproveitar os intervalos para, como a natureza, morrer um pouco e em seguida renascer esplendorosamente.