sábado, 11 de dezembro de 2010

Aproveitar o tempo agora por Cláudia Montezuma

Bem sei que só leva a cabo um projeto, um sonho, ou uma causa, aqueles que aproveitam o tempo, que não o desperdiçam com bobagens, que mantêm o foco.
Não conheço ninguém que seja muito bom em alguma coisa que não tenha tido que abrir mão de outras em nome de seu projeto maior.
Fui operada pelo Dr Paulo Niemeyer Filho e não esqueço das  conversas que tivemos. Viajar? Jamais. Nas poucas tentativas que fez de ir atrás de um  pouco de lazer, foi obrigado a voltar do aeroporto porque tinha vidas a salvar. Não há excelência sem alguma ou muita obsessão concluo. Estudar o tempo todo, se atualizar, praticar sem parar...essa a sua rotina.
Nem todos nós temos vidas em nossas mãos mas ainda assim, para “crescer e aparecer” não desfocar é fundamental.
Pegando esse exemplo do Dr Paulo, podemos imaginar que ele tem uma estrutura muito bem montada que permite sua total dedicação ao trabalho.
E nós que não temos? Que temos que cuidar de filhos, casa, carro, saúde da família, participar de todos os problemas e, se Deus quiser, soluções, cuidar dos amigos nem que seja um pouquinho, trabalhar, prover os recursos materiais e emocionais para todas as necessidades? Que tempo dá para tudo isso? Tem que saber aproveitar e muito não é não?
Mas não é desse aproveitar que queria falar. Queria refletir sobre o  que o “senso comum” vive dizendo:  “o que se leva dessa vida é a vida que se leva” ou “deixe de ficar em casa, aproveite a vida!”, ou ainda “adoro viver intensamente”.
Tudo isso confesso que me encafifa tremendamente.
Primeiro: nada se leva dessa vida, nem a vida que se leva. No máximo  se “deixa” alguma coisa: o que você fez de bom, a forma como marcou a vida dos que sobreviveram a você, a maneira e o carinho com que será lembrado. Ouvi alguém dizer  que a gente não morre enquanto houverem pessoas que lembrem da gente, que repitam o que dizíamos, que lembrem do nosso exemplo. O resto é nada.
Segundo, aproveitar a vida não deveria estar imediatamente associado ao que nos dá prazer e não a uma fórmula única que serviria para todos? Quem foi que disse que para mim  é mais proveitoso topar qualquer programa só para dizer que saí do que estar em casa sozinha lendo um ótimo livro ou vendo um ótimo filme?
E viver intensamente é o que? Para quem gosta efetivamente de surf, por exemplo, pode ser pegar todas as ondas do mundo. Para quem gosta de sexo, pode ser pegar um parceiro por dia. Para quem gosta de aventuras, pode ser cruzar um deserto a pé por ano, ou dar a volta ao mundo em um veleiro. Viver intensamente é o que é para cada um. O importante é estar inteiro em cada pequena coisa que você faz (como dizia o poeta: assim, a lua alta ilumina todo o lago). Isso é intensidade. Não fazer por fazer, porque todo mundo faz ou porque é bonito contar.
Já viram essas pessoas que viajam, fazem os roteiros mais “in” e não curtem nada? Fazem da viagem uma maratona, nunca “estão”em lugar nenhum, não curtem o “clima “ de nada....correm, correm....atrás do quê  ninguém pode saber, porque ver todos os monumentos e museus para cumprir um check-list para mim nunca foi viajar...Essas pessoas vão aos lugares para fotografar e só vão parar quando chegarem em casa, nos seus sofás dizendo para os amigos:“eu estive aqui”.
Que diferença pode fazer no prazer da sua viagem, ir a Roma e NÃO ver o Papa? Nenhuma, lógico.
Pense em ir ao Tibet, ver aqueles monges, sentir todo o clima e NÃO MEDITAR, NÃO ENTRAR NO CLIMA, só fotografar.
Tenho pena dessas pessoas. Elas passam a vida correndo atrás de alguma coisa que nem sabem explicar. Elas têm um vazio constante, uma pressa (há os que mal podem dormir em viagem para não ”perder” nada). Elas pensam que vivem intensamente mas esse intensamente nunca é o bastante.
Eu tenho pouquíssimas fotos das viagens que fiz. Aliás de qualquer momento mesmo que muito especial. Estou sempre tão “dentro” do momento, que a última coisa que me ocorre é fotografar  (lembrei agora dos japoneses e seus flashes intermináveis....tente “apreciar” a Monalisa. Não dá...são 500 japoneses na sua frente que não apreciam, só fotografam para ver em casa depois rsrs)
Assim, acho que existe uma enorme diferença entre aproveitar o tempo para fazê-lo render mais a nosso favor (mesmo assim isso  não significa estar sempre se perguntando se o tempo está ou não sendo aproveitado) e aproveitar a vida.
Que tenhamos todos o dom do discernimento para saber como melhor aproveitá-la e deixar nossas marcas, porque daqui não levaremos rigorosamente nada.
Ou não levar nem deixar, também é uma opção.
Mas que seja clara, sem subterfúgios, sem desculpas esfarrapadas do tipo "minha vida foi tão difícil....
Sartre dizia com muita propriedade: "O importante não é o que fizeram de nós, mas o que fizemos com o que fizeram de nós".

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