quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Uma prece, outra homenagem


Hoje tenho vontade de rezar. Acho que sei porque mas não vem ao caso agora. Não uma prece qualquer. Teria que ser algo diferente.
Tenho minhas orações que me servem como uma luva quando minha alma precisa delas. Mas tem que precisar mesmo. Uma prece mecânica não serve ao seu propósito.
Aí me lembrei de uma das mais lindas preces que já li na vida. Escrita por Clarice Lispector, musa inspiradora, eu acho, de todos os que têm a pretensão de tentar sondar a alma humana e mais ainda de escrever sobre ela.
Fui procurar nos meus livros e...achei!
Quem conhece a minha casa sabe o lugar desproporcional ao tamanho do espaço que meus livros ocupam. Ou o que sobrou deles. Porque não existe só o mistério do desaparecimento das meias. Há também o do desaparecimento dos livros! A gente empresta e, claro, livro emprestado é livro dado. Tem as viagens e os esquecimentos, sem contar as inúmeras mudanças de casa quando acho que lá se vão outros tantos.
Mas enfim...boa parte dos que marcaram a minha vida ainda estão aqui e não há prazer maior que me lembrar de uma passagem marcante,  não saber onde foi que li, folhear a esmo, tomar muitos rumos não previstos, ler coisas das quais nem me lembrava mais, me perder em labirintos esquecidos no fundo da memória e finalmente, achar! Isso pode levar um tempo que não sei contar. Horas? Madrugadas? Boa parte da vida? Não sei nem me importa.
Assim foi que achei a prece de Clarice que de tão linda quero compartilhar com todos os meus queridos amigos

“Alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma, pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém.

Um beijo muito muito carinhoso 

2 comentários:

  1. elizabeth s p mundim8 de outubro de 2010 às 22:48

    Claudia, minha querida
    li, reli, copiei, pois escrevendo apreendo melhor e mesmo assim há muito a refletir. Clarice Lispector nos toca PROFUNDAMENTE e te agradeço por compartilhar essa oração (não conhecia).

    Como a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, convivo com o mistério sem fazer indagações e te digo que fico em paz. De todas as graças recebidas, acho que essa é a maior, porque não me atormenta mais querer desvendar os desígnos de leis cósmicas e naturais.

    Saudade imensa, beijo carinhoso para você também.

    ResponderExcluir
  2. é linda né Beth? é tudo que gostaríamos. Que os mistérios não nos incomodassem, que as pequenas coisas fossem mesmo um presente.
    Obrigada por me ler e por postar seus comentários que sempre me arrepiam...
    Beijo querida

    ResponderExcluir