Quem remói, não mói só uma vez, mói várias vezes: re-mói. Se uma coisa já está moída, para que moer outra vez e outra e outra?
Poderia dizer que gosto de fazer meu pão com farinha re-moída, que fica mais leve e mais fofo, que a vida para mim só tem sentido e graça se, depois de re-moídos e re-finados exaustivamente os sentimentos, as emoções e as ações ainda sobrar alguma coisa com que me alimentar.
Poderia afirmar mesmo que só quero me alimentar do que foi re-moído e purificado. Re-tirados todos os disfarces, as segundas intenções, as máscaras, as mentiras ainda que sinceras.
Mas como isso parece chato para o mundo!
Como, paradoxalmente, o leve é o não re-moído, se possível sequer moído.
E aí fico sempre me perguntando:
Pensar nos sentimentos, na vida, nas pequenas ou grandes coisas é re-moer?
Sentir é re-moer?
Não querer ficar na superfície das águas que parecem profundas é re-moer? (claro que às vezes me engano e as águas são mesmo muito rasas)
É feliz quem não re-mói?
É chato quem re-mói?
Conversar sobre uma idéia não é já um certo re-moer?
Sobre o que falam as pessoas que não re-móem?
Conversar sobre uma idéia não é já um certo re-moer?
Sobre o que falam as pessoas que não re-móem?
Não sei responder e hoje essa pergunta está abismando minha noite.
Alguém me disse: “quem manda ficar remoendo coisas?”
E se ouvi isso é porque é assim que me vêem. É porque, para o mundo, ao re-moer estou dando mais peso às coisas do que de fato elas têm e não o contrário. É porque devo ser uma chata que não sei me divertir e curtir a leveza da vida.
Como adoraria ser objetiva e reta! Zerar cada acontecimento tão logo ele passasse! Simplesmente não pensar mais. Ter a cabeça sempre voltada só para o que interessa e pode dar resultados mensuráveis. Não me perder em divagações inúteis. Não dar às pessoas nem um minuto a mais do meu tempo do que elas merecem (em geral nenhum minuto).
Adoraria não me olhar tanto, não prestar tanta atenção ao que sinto, de preferência nem sentir.
Adoraria ser outra pessoa?
Não sei, mas tenho certeza de que, se tenho alguma qualidade, ela certamente é o outro lado da mania de re-moer. Não existe moeda de um lado só.
Por isso, ao resolver o que quero mudar em mim, preciso de muita sabedoria e coragem: vou mudar o que não gosto, mas junto irá embora todo o correspondente de que gosto, ao qual me afeiçoei e pelo qual me reconheço.
Vale a pena?
Logo eu, que adoro me perder para depois me achar?
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