segunda-feira, 3 de outubro de 2011

O Valioso Tempo dos Maduros - copiado, sem pedir licença, do blog português "Direito e Avesso" de Maria Josefa Paias

Mário Pinto de Andrade - "O valioso tempo dos maduros"

O valioso tempo dos maduros

Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente do que já vivi até agora.
Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas percebendo que faltam
poucas, rói o caroço.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir
assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas, que apesar da idade cronológica, são imaturos.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral.
'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência,
minha alma tem pressa...
Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana,
muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com
triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade,
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!

Mário Pinto de Andrade
Escritor e político angolano, de nome completo Mário Coelho Pinto de Andrade.
(1928-1990)

Nota: a todos quantos têm visitado esta página pensando tratar-se de um texto do escritor brasileiro Mário de Andrade, apresento desculpas, uma vez que o nome não estava tão completo.

2 comentários:

  1. Claudia, conheci este texto maravilhoso há uns 2 anos atrás. Em versão ligeiramente diferente (e atribuida a outro autor... Na verdade, nunca consegui confirmar de quem era a autoria), a bacia era de jabuticabas. De cara gostei da imagem, porque me fazia lembrar da minha infancia em Belo Horizonte e de quanta jabuticaba comi do pé. Só que, diferentemente desse menino (e na minha versão era uma menina), eu, desde pequena, acho que ja intuia a importancia das escolhas e nunca fui displicente ao comer as minhas jabuticabas. Comia logo as pequenas,azedinhas, e deixava aquelas bitolonas grandes, as mais docinhas, para o final... Como era bom finalmente saborear as grandonas cuidadosamente separadas!!!
    Acho que não existe imagem mais perfeita...A sensação de ver a bacia esvaziar e não querermos perder nem um pedacinho daquele sabor... De fruta... De vida... De frutos bons e doces da vida...
    Na versão que recebi, há um complemento que falta na sua versão para a frase que fala por mim e descreve com precisão o que sinto: "MEU TEMPO TORNOU-SE ESCASSO PARA DEBATER RÓTULOS, QUERO A ESSÊNCIA, MINHA ALMA TEM PRESSA DE RELACIONAR-SE COM A DELICADEZA NO TRATO, NAS PALAVRAS, NOS GESTOS COTIDIANOS..."
    Minhas poucas jabuticabas (ou cerejas), poucas, mas grandes, as maiores e mais doces, têm apenas esse sabor.Da essencia da alma, da delicadeza no trato, nas palavras, nos gestos cotidianos. E essas jabuticabas eu saboreio com cuidado, não deixo escapar nem um pedacinho... Pois guardam o segredo do sabor divino!
    Na época, lembro de ter pensado que era uma grande injustiça não ter sido eu a escrever este texto... Acho que merecia!!!
    Bjs

    Alice

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  2. Àlice,
    realmente a parte que falta no meu diz muita coisa. A delicadeza no trato, nas palavras e nos gestos é agora ou nunca. A essência da alma...ou nos ocupamos dela (a nossa e a dos que nos cercam) agora ou nunca mais. E que desperdício tantas essências ficarem sem ser saboreadas.
    Esse texto é de uma precisão impressionante. Em pouquíssimas palavras - considerando a profundidade do assunto, ele diz o essencial (seja lá quem for esse ele. Vou tentar saber).
    Você tem toda razão: são poucas mas são as melhores. As grandes e doces.
    Você nao escreveu todo, mas complementou lindamente!
    bj

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