Vem cá palavra sem dó nem
piedade!
Vem, e cala a ansiedade que me
atropela no caminho
Vem, e estanca o sangue que
jorra das artérias tão visíveis
Da mão que foi amputada a seco,
Do coração, arrancado antes da hora.
Vem cá palavra que me acalma
Dize quem és e do que és feita.
Facilita o vagar dessa alma incompetente!
Me enche de prazer sem
pensamento e me toca com dedos bem suaves
Transplanta meu coração para a
cabeça, e me deixa tão somente um mundo sensitivo
Esmigalha meus miolos e
prepara-os segundo a melhor receita de neurônios ao molho de sinapses.
Se já sem sangue, sem cérebro
e sem calma
Me jogo nessa vida agonizante,
Ora respirando, ora
ressuscitando
Ora silenciosa, ora esfuziante
Que palavra me foi sussurrada
e eu nem ouvi?
Ah se ao menos eu ouvisse
tanto quanto vejo
Se ao menos visse tanto quanto
sinto
Se pelo menos sentisse tanto
quanto penso
Espera! Se eu pensasse tanto
quanto intuo
Então seria música e eu não
mais com medo da palavra
Porque ela acabaria por dizer
o que eu nunca pretendi.
O sofrido e angustiante processo da criação. A jornada heroica de quem persegue - e muitas vezes é perseguido - pelas palavras. As que deveriam expressar o que se deseja expressar. E as que ganham vida própria e traduzem até o que não era a intenção primeira. O poeta assaltado. Seja na busca do que e como dizer. Seja na mão emprestada ao que não se controla.
ResponderExcluirSua odisseia. Linda. Sensível. E, como sempre, visceral.
Bjs.
Alice
PS O.D.E.I.O os seus 20 min!
Adorei esse coment'ario. Como nāo vi antes?
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